Nem que eu viva 100 anos…
Era suposto ter inserido o texto aí em baixo no novo site da A25, mas parece que a coisa não correu muito bem… Deixo-o aqui.
Nem que eu viva 100 anos, não esquecerei nunca aquela tarde: 2 de Outubro, 1974, aeroporto da Portela. O avião que trazia o meu batalhão de Luanda, depois de 24 meses de Cabinda, Buco Zau, Bata Sano, acaba de aterrar. O meu grupo de combate já sabe que vamos chegar a um país diferente daquele de onde saímos em 2 de Agosto de 72. E já sabe que quem fez as mudanças iniciais foi a tropa. E que, se cá estivéssemos, éramos nós também, de certeza.
Entramos na loucura daqueles dias.
Depois, cada qual para seu sítio. Alguns reencontram-se de quando em vez. Mas pelo meu lado passo a ficar muito ocupado: a 9 de Outubro, Câmara de Oeiras. Sempre, «Notícias da Amadora». Ainda mais umas cadeiras na Faculdade de Direito de Lisboa. Sempre: Autarquias, autarquias, autarquias: informação, informação, informação.
Daqueles dias quentes, acelerados, cheios, intensos, vivos – grandes recordações: as manifs, os plenários, a malta a aprender democracia, os contactos com o RAC, as assembleias até ás 4 da matina, o mini sempre a queimar e a puxar, a Habitat, a Sorefame, a Cometna, os Cabos Ávila, a Bertrand… os sindicatos e os sindicalistas, agora com outros alvos, a malta a contar como tinha sido Caxias e a libertação, o primeiro 1º de Maio, as guerras nascentes à esquerda, os esquerdistas, a direita troglodita, as ameaças reais à democracia, os meus conhecimentos de táctica e de guerrilha de operações especiais postos à prova aqui e ali… o Povo na rua, a rua é do Povo, MFA-Povo, os autocolantes que são bandeiras, os partidos, os CDRs, as comissões de moradores… que riqueza sociológica e política a daqueles meses.
Por mais que eu viva, nunca esquecerei.
O «meu» 1º Comunicado do MFA
Hoje, expressamente para colocar aqui, procurei e por mero acaso não é que encontro: este é o 1º Comunicado do MFA que eu ouvi nas rádios de Portugal depois de regressado da guerra colonial foi este (tirei-o daqui):
«O M. F. A. NÃO TEM PARTIDO»
(6/11/74)
«Tendo surgido ultimamente algumas referências susceptíveis de interpretações incorrectas sobre a ligação do M. F. A. com partidos ou movimentas políticos, a Comissão Coordenadora do Programa do M. F. A., através da 5ª Divisão do BE. M. G. F. A., esclarece:
O M. F. A. fez uma revolução para derrubar o fascismo, devendo, portanto, a sua orientação ser considerada na linha progressista.
À esquerda do fascismo (fórmula política do desespero para garantir a manutenção do capital monopolista) situa-se um leque de possíveis soluções todas eivadas em maior ou menor grau de tendências socialistas. São elas que representam o sentido progressista dia revolução, pois baseiam-se no reconhecimento de que o Estado terá de intervir para garantir o caminho da maior justiça social.
O M. F. A. não tem partido político, nem é um partido político.
O M. F. A., interpretando a vontade da esmagadora maioria dos portugueses, dinamiza as Forças Armadas que nele se vão transformando, polariza todas as forças democráticas e exige o cumprimento do programa que apresentou à Nação.
O M. F. A. encontra-se acima dos partidos políticos, aceitando todos os que se não oponham ao seu programa. Unido com o povo, assegura a instauração de uma autêntica democracia pluralista em Portugal.
O M. F. A. encontra-se atento relativamente àqueles que, camuflada mente, fazem o jogo da reacção, e combate, vigorosamente, todas as formas de sabotagem da ordem pré-democrática estabelecida.
O M. F. A. não se encontra comprometido com qualquer movimento político.
Acolhe e incentiva as forças antifascistas, mas não se vincula a nenhuma delas, porquanto são múltiplas as formas de expressão democrática e todas são necessárias e devem existir, traduzindo a variedade das opiniões e a prática das liberdades».
O meu «Comunicado» hoje para o MFA de 74
O meu curto comentário àqueles dias loucos é este, hoje, mais de 32 anos e meio depois:
Nem que eu viva 100 anos, não esquecerei aqueles meses. Nem lhes agradeço. Fizeram a vossa obrigação. Voltem sempre…
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