Tuesday, September 05, 2006

XIV – SERÁ O COMPLEMENTO DE SOLIDÁRIO PARA O IDOSO DE SÓCRATES UMA BURLA?
Uma das medidas mais utilizadas na propaganda do governo foi o “complemento solidário para idosos” (agora quase já não se fala), uma medida que Sócrates apresentou durante a campanha eleitoral, como a que iria tirar os idosos da miséria em que muitos vivem em Portugal.

De acordo com o Eurostat, cerca de 21% da população portuguesa, que corresponde a mais de 2.500.000 portugueses vivem abaixo do limiar da pobreza, ou seja, têm menos de 300 euros por mês para viver. Por outro lado, existem em Portugal cerca de 840.000 pensionistas a receber pensões mínimas do Regime Geral (entre 223 euros e 343 euros por mês); 120.000 a receber a Pensão Social (entre 187 euros e 203 euros por mês); e 240.000 a receber a Pensão do Regime Especial das Actividades Agrícolas (206 euros por mês). Deste total, um milhão e duzentos mil reformados recebem pensões inferiores a 300 euros, que é aquele valor considerado pelo próprio Sócrates como o limiar da pobreza, ou seja, abaixo do qual se passa fome em Portugal.

No entanto, apesar dos números oficiais sobre a pobreza em Portugal serem estes, o eng. Sócrates, em plena campanha eleitoral, decidiu que os reformados que precisavam do apoio do Estado, para sair da situação de miséria em que se encontravam, eram apenas 300.000, ou seja, um em cada quatro reformados com pensão inferior a 300 euros por mês.

No entanto, Sócrates, como 1º ministro Sócrates, considerou tal redução ainda insuficiente. Para reduzir ainda mais aquele número, publicou dois decretos – o Decreto-Lei 232/2005 e o Decreto Regulamentar 3/2006 - que regulam o chamado “complemento solidário para idosos”, os quais visam, por um lado, reduzir a um número muito pequeno e mesmo ridículo os reformados que acabarão por receber tal prestação extraordinária e, por outro lado, atirar a maquiavelicamente pais contra os filhos.

Assim, de acordo logo com a alínea c) do nº4 do artº 4 do Decreto-Lei nº 232/2005, o reformado só tem direito ao “complemento solidário” se “declarar a disponibilidade para exercer o direito de crédito que tenha ou venha a ter sobre terceiros” ou, para ser mais claro, sobre os filhos, recorrendo mesmo aos tribunais. E isto porque na determinação do rendimento do pensionista entram não apenas os seus rendimentos, mas também os dos filhos. Efectivamente, de acordo com a alínea b) do nº 1 do artº 6º do mesmo decreto, na “determinação dos recursos do requerente são tidos em consideração os rendimentos dos filhos do requerente na qualidade de legalmente obrigados à prestação dos alimentos nos termos do artº 2009 do Código Civil”.

Assim, ao rendimento do pensionista é depois adicionado aquilo a que o nº2 do artº 9 do Decreto Regulamentar 3/2006 chama “componente de solidariedade familiar”, ou seja, a importância que cada filho deve entregar mensalmente aos pais.

De acordo com o Decreto Regulamentar 3/2006, publicado pelo governo de Sócrates, esta “componente de solidariedade familiar” corresponde a determinada percentagem do chamado “valor de referência do complemento”, ou seja, dos 300 euros por mês. O filho só não será obrigado a pagar a chamada “componente de solidariedade familiar” se a sua família tiver um rendimento “percapita” inferior a 750 euros por mês (e tenha-se presente que no cálculo do valor “percapita”, o 2º e restantes adultos só valem 0,7 e uma criança apenas 0,5). Acima de 750 euros por mês qualquer filho é obrigado a contribuir para “complemento solidário para idosos”, variando esse contributo entre 15 euros e 30 euros por mês e por filho. No entanto, de acordo com o nº6 do artº 7º do Decreto Regulamentar 3/2006, “quando o valor do rendimento por adulto equivalente de cada um dos agregados fiscais do filho do requerente é superior a 1.500 euros por mês “ o reformado deixa de ter direito a qualquer complemento mesmo que o seu rendimento total seja inferior a 300 euros por mês.

Cada filho é assim obrigado a pagar a chamada “componente de solidariedade familiar”, e a soma das “componentes de todos os filhos é deduzida então aos 300 euros, e ao que resta deduz-se depois os rendimentos do reformado ( a pensão mais qualquer outro rendimento que tenha). O valor que fica depois destas duas deduções, se ainda restar alguma coisa, é o valor do “complemento solidário para idoso” que o reformado terá direito a receber da Segurança Social. Como se vê o esquema está pensado de forma que sejam os filhos a suportar a maior parcela do “complemento solidário para idosos”. E não se pense que a tentativa para atirar os pais contra os filhos se reduz apenas ao inicialmente referido. Assim, a alínea c) do nº 3 do artº 27 do Decreto Regulamentar 3/2006 estabelece que o pensionista deve apresentar obrigatoriamente no momento em que requer o complemento uma “declaração de disponibilidade para exercer o direito a alimentos” contra os filhos recorrendo naturalmente aos tribunais. E o nº 5 do artº 29 do mesmo decreto publicado pelo governo de Sócrates dispõe o seguinte:” a concretização da disponibilidade prevista deve ser realizada no prazo de 6 meses após o reconhecimento do direito ao complemento, através da entrega de duplicado da apresentação em juízo da respectiva petição inicial”; portanto, o reformado tem um prazo de 6 meses para desencadear uma acção nos tribunais contra os filhos, pois se o não fizer, de acordo com o nº6 do mesmo artigo, perde o direito ao chamado “complemento solidário para idosos”.

Se juntarmos a tudo ainda o número de impressos e documentos que os reformados têm de apresentar quando requerem o complemento, é evidente que o objectivo e o resultado final será que um número muito escasso de reformados acabará por receber o chamado “complemento solidário para idosos”. A confirmar isso está o facto do governo não divulgar o número de pensionistas que estão a receber o complemento. Como está a suceder em outras áreas a propaganda do governo procura ocultar a realidade e utiliza maciçamente nessa propaganda medidas com reduzidos efeitos reais.

XV- SERÁ VERDADE QUE O GOVERNO DO PS PROPÕE QUE OS TRABALHADORES DESCONTEM TAMBÉM PARA FUNDOS DE PENSÕES OU QUE TRABALHEM PARA ALÉM DOS 65 ANOS PARA COMPENSAR A REDUÇÃO DAS SUAS PENSÕES?

Face à redução das prestações, em particular das pensões de reforma que as suas propostas naturalmente determinariam se forem aprovadas , o governo do PS tira da cartola duas soluções milagrosas, que propõe aos trabalhadores, para compensar aquela redução. E essas soluções são as seguintes: - Que os trabalhadores, e nunca as empresas, descontem mais (outro desconto para além do desconto para a Segurança Social) agora para fundos de pensões que vão ser geridos por privados ou então que trabalhem para além dos 65 anos (ou seja, aumento da idade da sua reforma).

Efectivamente como consta de um dos documentos distribuídos pelo Ministério do Trabalho e da Segurança Social aos parceiros sociais, o governo defende “ a criação de um novo regime complementar público de contas individuais (ou seja, de fundos de pensões), assente nos princípios de contribuição definida (portanto, semelhante aos PPR, sabe-se o que se paga, mas não se sabe o que se vai receber, tudo dependendo da bolsa), a ser financiado pelas contribuições voluntárias dos beneficiários da Segurança Social (ou seja, exclusivamente pelos trabalhadores), devendo a sua gestão vir a ser parcial ou totalmente contratualizada com o sector privado”.

Para além disso, o governo também se propõe fomentar os chamados Fundos de Pensões de base profissional, a serem criados pelas empresas, através da concessão de elevados benefícios fiscais.

Em resumo, é assim que o governo de Sócrates pretende fomentar o desenvolvimento dos fundos de pensões à custa dos trabalhadores, tanto reivindicados pelos bancos e seguradoras que controlam a maioria das sociedades gestoras de fundos de pensões. Por isso, não é de estranhar que os representantes dos patrões tenham manifestado já e publicamente a sua grande satisfação com as propostas do governo.

Em alternativa em descontar mais para um Fundo de Pensões para assim obter uma outra pensão que compense a redução que as suas medidas determinariam na pensão paga pela Segurança Social, o governo propõe aos trabalhadores que trabalhem mais anos para além dos 65 anos, ou seja, que aumentem a sua idade de reforma para assim poderem receber uma pensão igual à que receberiam se ela fosse calculada como era até 2006.

Assim aos trabalhadores com 65 anos de idade e 40 anos de descontos que continuassem a trabalhar teriam uma bonificação na pensão de 1,09% por cada mês de serviço a mais, e aos com 65 anos mas com carreiras contributivas entre os 15 anos e os 39 anos a bonificação mensal variaria entre 0,33% e 0,65%. Fazendo os cálculos necessários conclui-se que o trabalhador para ter a pensão sem reduções teria de trabalhar para além dos 65 anos entre 1 a 2 anos mais aos 2016; entre 1,5 anos e 4 anos mais em 2026; entre 2 anos e 5 anos mais em 2036; entre 2,5 anos e 6 anos mais em 2046. Por outras palavras , embora diga em palavras que não aumenta a idade legal de reforma, o governo PS pretende obrigar de facto os trabalhadores a trabalharem muito mais para além dos 65 anos para poderem receber uma pensão sem reduções.

XVI- SERÁ QUE AS PROPOSTAS DO GOVERNO PS TAMBÉM SE APLICARIAM A TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA?

As propostas do governo também se aplicariam, se forem aprovadas e promulgadas a todos os trabalhadores da Administração Pública que se encontram inscritos no Regime Geral da Segurança Social e, igualmente aqueles, que embora inscritos na CGA entraram para a Administração Pública depois de 1 de Setembro de 1993. E isto porque de acordo com o artº 1º do Decreto-Lei nº 286/93 “ a pensão de aposentação dos subscritores da Caixa Geral de Aposentações inscritos a partir da entrada em vigor do presente decreto-lei (1 de Setembro de 1993) é calculada nos mesmos termos das normas legais aplicáveis ao cálculo das pensões dos beneficiários do regime geral da Segurança Social”. Portanto, a aplicação seria imediata. E o número de trabalhadores da Administração Pública que seriam abrangidos já ultrapassa os 300.000.

Apenas aos trabalhadores que entraram para Administração Pública antes de 1 de Setembro de 1993, que se encontram inscritos na CGA, é que se aplica a Lei 60/2005 que alterou o Estatuto da Aposentação em Novembro de 2005. Enquanto esta lei não for alterada, as propostas do governo PS mesmo se forem aprovadas não se aplicariam. No entanto, o ministro das Finanças já veio dizer que o objectivo do governo é a convergência portanto é previsível que o governo só não avance para tal alteração se encontrar pela frente uma forte oposição de todos os trabalhadores.

XVII – SERÁ VERDADE QUE NÃO EXISTEM ALTERNATIVAS À “REFORMA “ DO PS E À DO PSD/CDS?: - As 8 medidas alternativas que garantiriam a sustentabilidade

O governo PS assim como toda a direita afirmam continuamente que não existem medidas alternativas às suas propostas.

Contrariamente ao que tem afirmado o governo PS e o PSD/PP, e os seus defensores incluindo o pensamento económico que domina os media, existem soluções que garantiriam a sustentabilidade da Segurança Social a médio e a longo, porque a curto certamente não se verificará grandes problemas, e que evitariam a redução das pensões, mas que o governo tem sistematicamente recusado debater.

O governo e toda a direita têm repetidamente afirmado (uma mentira repetida muitas vezes, acaba por passar por verdade) que a sustentabilidade da Segurança Social se tem de fazer fundamentalmente pelo lado da despesa, ou seja, reduzindo ainda mais as já baixas prestações pagas em Portugal (recorde-se que mais de 85% dos reformados recebem pensões inferiores ao salário mínimo nacional), ignorando o que está na própria Lei de Bases da Segurança Social (Lei 17/2002) sobre a diversificação das fontes de financiamento.

Sem procurar esgotar as medidas alternativas, apresentam-se e analisam-se seguidamente oito medidas, que se fossem implementadas garantiriam a sustentabilidade da Segurança Social a médio e a longo prazo. E essas medidas são nomeadamente as seguintes: (1) Uma politica de crescimento económico e de aumento do emprego; (2) Uniformização das múltiplas taxas contributivas que continuam a existir na Segurança Social, substituindo-as pela Taxa Social Única; (3) A resolução do problema do regime dos independentes, nomeadamente dos “falsos recibos verdes”; (4) Um combate muito mais eficaz à evasão e à fraude no pagamento de contribuições à Segurança Social; (5) O pagamento pelo Estado das dividas que tem ao Regime Geral da Segurança Social; (6) A criação de uma taxa sobre o Valor Acrescentado Liquido (VAL) a ser paga pelas empresas que contribuem pouco para a Segurança Social; (7) A parcela da riqueza liquida criada anualmente pelas empresas que não paga contribuições para a Segurança Social passe a pagar; (8)Uma contribuição de solidariedade a ser paga pelos rendimentos isentos de imposto e por bens que são indicadores de fortuna.

Seguidamente explica-se e fundamenta-se tecnicamente cada uma dessas medidas embora de uma forma sintética atendendo à natureza deste estudo, que conjugadas garantiriam o aumentos das pensões dos trabalhadores e dos reformados no futuro assim como a sustentabilidade financeira da Segurança Social a curto, médio e a longo prazo.

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