1- Um combate muito mais eficaz à evasão e à fraude no pagamento de contribuições à Segurança Social
De acordo com informação que obtivemos contida na resposta a um requerimento que fizemos ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social enquanto estivemos como deputado na Assembleia da República, no final de 2004, a divida declarada à Segurança Social atingia 2.978 milhões. E segundo a resposta dada a um requerimento feito pelo deputado Jorge Machado do grupo parlamentar do PCP , no fim de 2005, a divida declarada já atingia 3.400 milhões de euros, ou seja, num ano aumentou em 422 milhões de euros. Durante o ano de 2005, a divida recuperada atingiu apenas 280,7 milhões de euros, sendo a declarada apenas 65%, o que corresponde a 182,455 milhões de euros. Isto significa que a divida declarada está a aumentar muito mais rapidamente do que se consegue recuperar. “A meta do governo prevista no chamado Plano de Combate à Fraude e Evasão Contributiva para 2006, corresponde a 350 milhões de euros, dos quais se estima que cerca de 75% corresponderá à recuperação da divida declarada à Segurança Social” (resposta do MTSS a um requerimento do PCP). Isto significa que dos 3.400 milhões de euros em divida no fim de 2005, apenas se prevê recuperar 262,5 milhões de euros. Face a estes números do próprio governo, é evidente que o combate à fraude e evasão contributiva do governo PS, tão mediatizado pelos órgãos de comunicação social, está a ter resultados manifestamente insuficientes e de eficácia reduzida.
Mas a dimensão e gravidade do problema não fica por aqui. Os dados apresentados referem-se apenas à divida declarada, ou seja, aquela que os próprios sujeitos passivos tomam iniciativa de a declarar à Segurança Social, embora depois não paguem. De acordo com cálculos realizados, concluímos que a Segurança Social está a perder anualmente receitamos que estimamos em 3.854 milhões de euros em 2005, como mostram os dados do quadro XIII
QUADRO XIII – Estimativa da receita perdida pela Segurança Social só em 2005 devido à fraude, evasão, não pagamento e a privilégios concedidos a empresas e outras entidades
DESIGNAÇÃO
2005
Milhões euros
1- Remunerações do Trabalho segundo Relatório B. Portugal -2005
+ 59.832
2-Remuneraçõe Administração Publica – Relatório CGA -2005
(-) 15.311
3-Outras remunerações que não descontam para a Segurança Social
(-) 2.100
4- REMUNERAÇÕES QUE DESCONTAM PARA A S. SOCIAL =1-(2+3)
+ 42.421
5-RECEITA POTENCIAL da S. Social =( 4) x Taxa Social Única (34,75%)
+ 14.741
6-RECEITAS EFECTIVAS DA SEGURANÇA SOCIAL EM 2005 (segundo o governo) = Quotizações dos trabalhadores + contribuições das empresas
(-)10.887
7-RECEITA PERDIDA PELA SEGURANÇA SOCIAL EM 2005 = (5-6)
3.854
FONTE : Relatório Banco de Portugal – 2005; Relatório da CGA – 2005; Informação do governo
Mas antes de avançarmos interessa explicar como se obteve os dados do quadro anterior até para o leitor poder avaliar a sua consistência técnica.
Assim, para obter uma estimativa da receita perdida pela Segurança Social só em 2005, pegamos no valor das Remunerações do Trabalho a nível nacional, que consta do Relatório do Banco de Portugal, e retiramos as contribuições patronais para a Segurança Social e para a CGA pois o valor de constante do Relatório (74.968 milhões de euros segundo o constante da pág. 177) inclui essas contribuições e assim obtivemos o valor de 59.832 milhões de euros que consta do quadro. Depois deduzimos a este valor as remunerações que não descontam para a Segurança Social, que são as da Administração Pública (só aquelas que descontam para a CGA) e as que descontam apenas para Fundos de Pensões (por ex., uma parte dos trabalhadores bancários), e obtivemos o valor de 42.421 milhões de euros, que são aquelas que deviam “descontar” para a Segurança Social.
Seguidamente aplicamos a este valor a Taxa Social Única , que é 34,75% (11% dos trabalhadores e 23,75% das empresas) e obtivemos aquilo que chamamos “Receita Potencial da Segurança Social”, que é 14.741 milhões de euros, que seria aquela receita que a Segurança Social devia ter recebido em 2005 se não existe fuga, fraude, evasão, não pagamento, isenções, taxas contributivas reduzidas, etc..
Depois subtraímos a esse valor – 14.741 milhões de euros – a receita efectiva resultante das quotizações dos trabalhadores e das contribuições das empresas que, segundo o governo, a Segurança Social teve efectivamente em 2005 – 10.887 milhões de euros, e obteve-se uma estimativa da receita perdida pela Segurança Social só em 2005 deve ter atingido 3.854 milhões de euros.
Se retiramos o crescimento verificado na divida declarada em 2005 – 422 milhões de euros - mais os 300 milhões de euros recuperados em 2005, mais a receita perdida devido a taxas reduzidas – 271,8 milhões de euros em 2005 – ficam ainda 2.860,2 milhões de euros que não foram declarados à Segurança Social em 2005, e que resultam fundamentalmente de remunerações pagas aos trabalhadores mas não declaradas à Segurança Social.
A questão que se coloca imediatamente é a seguinte: Porque razão se continua a verificar esta elevada ineficácia neste combate fundamental para garantir a sustentabilidade financeira da Segurança Social, que se procura ocultar através da propaganda e mediatização? E a resposta é a falta de meios que o governo tem afectado a este combate fundamental. No fim de 2005, existiam apenas 198 inspectores da Segurança Social para todo o País. Na pergunta que fizemos ao ministro Vieira da Silva sobre o reforço de meios humanos previstos para 2006, a resposta que obtivemos é que estava previsto apenas um curso para 30 inspectores. Estivemos em Maio de 2006 num debate sobre Segurança Social no distrito de Bragança e fomos informados que para todo o distrito existiam apenas 3 inspectores que, para além das inspecções às empresas, ainda tinham de fazer o controlo do subsidio de desemprego e do subsidio de doença. É evidente que este governo não considera o trabalho no terreno, ou seja, a ida as empresas como vital, talvez para não incomodar o patronato. Está muito mais interessado na propaganda, como prova a campanha feita pelo governo pelo facto de divulgar uma lista de devedores da Segurança Social que abrange apenas dividas num valor de 100 milhões de euros, ou seja, cerca de 2,9% da divida declarada à Segurança Social que existia no fim de 2005 e apenas 2,6% da receita perdida pela Segurança Social em 2005.
Para aumentar a eficácia deste combate que é importante e, consequentemente, para obter resultados significativos seria necessário que o governo invertesse a sua estratégia, e passasse a considerar a inspecção às empresas como a peça fundamental deste combate, embora apoiada numa informação orientadora da acção resultante da utilização de bases de dados consistentes e de cruzamentos sistemático de dados o que ainda não é feito (por ex., o cruzamento de dados sistemático entre a Segurança Social e a Administração Fiscal ainda não é feito, apesar do governo dizer o contrário).
Estimamos que com a mudança de estratégia, com a afectação dos meios humanos e materiais necessários (actualmente muitos inspectores que se aposentam não são substituídos), com a inspecção sistemática das empresas e com um cruzamento real de dados, rápida e facilmente se podia mais que triplicar os resultados – passar dos 380 milhões de euros para mais de 1.140 milhões de euros -, o que representaria apenas 40% das receitas perdidas pela Segurança Social devido a remunerações não declaradas e constituiria um contributo já importante para a sustentabilidade financeira da Segurança Social a médio e a longo prazo, substituindo desta forma as reduções nas pensões que o governo pretende impor.
2- É necessário alterar a situação em que cerca de metade da riqueza liquida criada anualmente pelas empresas continua a não contribuir para a Segurança Social
O actual sistema de cálculo das contribuições das empresas para a Segurança Social foi criado há cerca de 50 anos. Quando surgiu as condições de funcionamento das empresas e da economia eram profundamente diferentes e, por essa razão, está profundamente desactualizado. Há 50 anos as empresas que criavam mais riqueza eram as de trabalho intensivo, ou seja, que empregavam muitos trabalhadores. Actualmente, devido ao grande desenvolvimento da ciência e da técnica, isso já não é verdade. As empresas que agora criam mais riqueza são de conhecimento e capital intensivo, e não necessariamente as que empregam mais trabalhadores. Como as contribuições das empresas para a Segurança Social continuam a ser calculadas com base nas remunerações, e como estas representam menos de metade da riqueza criada, existe uma parte que é cada vez maior, que não paga contribuições para a Segurança Social, o que contribui para as dificuldades financeiras crescentes que a Segurança Social enfrenta.
O quadro seguinte, construído com dados constantes do Relatório do Banco de Portugal de 2005, mostra de uma forma quantificado o valor da riqueza criada anualmente pelas empresas que não paga contribuições para a Segurança Social.
QUADRO XIV – Riqueza criada anualmente pelas empresas que não contribui para a Segurança Social
PIBpm
PILpm
REMUNERAÇÕES
RIQUEZA DAS EMPRESAS QUE NÃO PAGA CONTRIBUIÇÕES
ANOS
(Inclui Amortizaçõe)
(Sem amortizações)
(N/ inclui contribui-ções patronais)
PIBpm (-) Remunerações
PILpm (-) Remunerações
Milhões de euros
2000
122.270
97.816
49.075
73.195
48.741
2001
129.308
103.446
51.693
77.615
51.753
2002
135.434
108.347
54.300
81.134
54.047
2003
137.935
110.348
55.260
82.675
55.088
2004
143.041
114.433
57.518
85.523
56.915
2005
147.014
117.611
59.832
87.182
57.780
SOMA
815.002
652.002
327.677
487.325
324.324
FONTE : Relatório do Banco de Portugal – 2005
Se retiramos ao Produto Interno Bruto a preços de mercado (PIBpm), que inclui ainda as amortizações, o valor dos “Ordenados e Salários” que já contribuem para a Segurança Social, obtém, para o período 2000-2005, 487.375 milhões que não pagaram contribuições para a Segurança Social, que é superior em cerca de 49% à parcela que paga, que corresponde aos valor dos “Ordenados e Salários” que, para o mesmo período (2000-2005), somou apenas 327.677 milhões de euros.
Se utilizarmos com base de cálculo o Produto Interno Liquido a preços de mercado (PILpm), que se obtém subtraindo ao PIBpm as amortizações, ainda se obtém, para o período 2000-2005, 324.324 milhões de riqueza liquida criada pelas empresas que não contribuiu para a Segurança Social. É evidente que se a totalidade das riqueza criada anualmente pelas empresas contribuísse para a Segurança Social, como acontece com os trabalhadores que têm de descontar para a Segurança sobre a totalidade das suas remunerações, a situação financeira actual seria muito diferente.
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