1- A “reforma” da Segurança Social defendida pelo PSD/PP e pelo patronato
Tanto o PSD como o CDS atacam a “reforma” do governo PS, não porque a considerem que ela terá consequências graves para os trabalhadores e reformados, mas fundamentalmente porque ela não satisfaz plenamente os interesses de classe que defendem, nomeadamente das seguradoras e banca.
Estes dois partidos da direita defendem que é necessário alterar o paradigma que caracteriza a Segurança Social pública, introduzindo aquilo que chamam o regime de capitalização, ou seja, o chamado “plafonamento” (tecto) contributivo para a Segurança Social. Isto determinaria que uma parte dos descontos dos trabalhadores deixariam de ir para a Segurança Social e passariam a alimentar os fundos de pensões privados. E que as empresas acima do tecto contributivo (por ex. dos 6 salários mínimos nacionais) deixariam de contribuir para a segurança social dos seus trabalhadores. Desta forma, atingiriam dois objectivos: (1) Criar-se-ia um mercado alimentado por descontos obrigatórios dos trabalhadores para os fundos de pensões privado, que é um negócio altamente lucrativo para as seguradoras e para a banca; (2) As empresas reduziriam as suas contribuições para a segurança social dos seus trabalhadores, porque deixariam de contribuir acima do “plafond” estabelecido já que os fundos de pensões seriam alimentados com descontos feitos nos salários dos trabalhadores, como permite a Lei de Bases da Segurança Social (Lei 17/2002) aprovado pelo governo do PSD/PP.
Vieira da Silva, Ministro do Trabalho e da Segurança Social, no artigo que publicou no DN de 14 de Agosto de 2006, caracterizava a proposta do PSD da seguinte forma: “redução em um terço da pensão garantida pelo sistema da Segurança Social; segunda pensão de valor indeterminado e igualmente dependente do aumento da esperança de vida; redução gigantesca de receitas para a Segurança Social, só em parte compensada por redução de despesas (demorando cerca de mais de 20 anos até atingir um novo ponto de equilíbrio”. Infelizmente as criticas que faz à “reforma” do PSD/PP também se aplicam, com alguns pequenos ajustamentos, à “reforma” do PS como fica claro neste estudo, ma isso não teve a coragem de o dizer.
Esta “reforma” da Segurança Social defendida pela direita teria consequências desastrosas quer para a Segurança Social quer para os trabalhadores que se reformassem no futuro. Assim, em relação à Segurança Social ela começaria imediatamente a perder de uma forma crescente receitas, resultante do facto de que uma parte dos descontos dos trabalhadores e das contribuições das empresas deixariam de entrar para a Segurança Social (os valores acima do tecto contributivo), enquanto a redução nas pensões dos trabalhadores só teria lugar quando estes se reformarem (portanto, só depois de perda de receitas durante 35 anos é que se verificariam reduções nas pensões pois só nessa data é que se reformariam os trabalhadores atingidos pelo “plafonamento”). E isto porque de acordo com a proposta do governo PSD/PP, apresentada por Bagão Félix, o “plafonamento” das contribuições só se aplicaria aos trabalhadores com 30 anos ou menos de idade, o que determinaria que só após terem passado 35 anos é que estes trabalhadores se poderiam reformar. E só quando eles se reformassem é que se registaria uma diminuição de despesas para Segurança Social resultante do pagamento de reformas mais baixas.
De acordo com dados divulgados pelo próprio PSD/PP (pelo debutado Negrão num debate que participamos com ele na SIC), o “rombo” para a Segurança Social devido a esta reforma atingiria 40.000 milhões de euros. A diferença entre o PSD e CDS nesta contra-reforma da Segurança Pública, pois ambos estão de acordo na introdução do “tecto contributivo”, é como financiar este “rombo”. O PSD defende que ele seja financiado através do aumento da divida publica, o que determinaria que os portugueses tivessem de a pagar no futuro através de aumento de impostos. O CDS defende que este rombo da Segurança Social devia ser pago através da generalização das privatizações, o que significaria a privatização de serviços importantes da Administração Pública, nomeadamente da sua capacidade para fornecer serviços essências à população, como são a saúde, a educação, os transportes, a água, etc..
A “contra-reforma” do PSD/PP para além de determinar um rombo na Segurança Social, agravando as suas dificuldades devido à elevada perda imediata de receitas que provocaria, também causaria um importante rombo nas já baixas pensões recebidas pelos portugueses quando se reformam.
E isto porque a partir de um determinado valor dos seus salários (o “plafond” ou tecto) muitos trabalhadores deixariam de descontar para a Segurança Social acontecendo o mesmo com as empresas. Ao descontarem para a Segurança Social apenas sobre uma parte dos seus salários naturalmente a pensão que receberiam desta seria muito inferior àquela que receberiam se tivessem descontado sobre a totalidade do seu salário. Por outro lado, o desconto não entregue à Segurança Social reverteria para fundos de pensões privados. E o valor da parcela da pensão paga pelos fundos de pensões depende não só do valor do desconto mas também da bolsa, porque esse dinheiro seria aplicado pelas sociedades gestoras de fundos de pensões na bolsa de valores. Portanto, o trabalhador saberia o que pagava mas nunca saberia a pensão que iria receber, pois ela passaria a depender da bolsa. Para além disso, esta parcela da pensão paga pelos fundos de pensões seria muito baixa ainda pelas seguintes razões: (1) Quando o trabalhador estivesse desempregado ou doente não contribuiria para o fundo de pensões privado, portanto este tempo não contaria (na Segurança Social o tempo em que o trabalhador está no desemprego ou doente conta para efeitos de formação da pensão); (2) Como as empresas deixariam de contribuir para a pensão dos seus trabalhadores acima do tecto contributivo (o “plafond”), a parcela da pensão que o trabalhador receberia do fundo de pensões ainda seria mais baixo.
É esta a “reforma” do PSD/CDS e do patronato, defendida também pelo pensamento económico único que domina os meios de comunicação social, a qual representaria um rombo nas receitas da Segurança Social, agravando as suas dificuldades financeiras, e um rombo nas pensões dos trabalhadores, baixando-as e tornando-as dependentes da bolsa, mas que representaria um grande negócio para as seguradoras e banca que dominam as sociedades gestoras de fundos de pensões.
2- A “reforma” da Segurança Social do governo PS
O governo PS parece que não defende a introdução do “plafonamento”, como pretendem o PSD/PP. E dizemos parece porque este governo do PS tem sido useiro e vezeiro em dizer uma coisa hoje e amanhã fazer outra esquecendo os compromissos assumidos na véspera. Servem de exemplos comprovativos deste comportamento pouco sério o aumento do IVA, quando Sócrates se tinha comprometido publicamente na TV a não aumentar os impostos; a imposição da generalização das carreiras longas na Administração Pública para se poder receber a pensão completa (trabalhar para além dos 65 anos ou ter mais de 40 anos de serviço), quando o 1º ministro se tinha comprometido publicamente perante também as câmaras de TV que isso não sucederia com a alteração da lei da aposentação; não aumentar a idade da reforma (ser obrigado a trabalhar para além dos 65 anos ), e o ministro do Trabalho e da Segurança Social apresenta uma proposta de “reforma” que se fosse aplicada determinaria que os trabalhadores que se reformassem no futuro, para poderem receber uma pensão completa igual à que é paga actualmente, teriam de trabalhar para além dos 65 anos.
Embora sempre com as limitações que caracterizam os compromissos deste governo PS, a sua proposta de “reforma” assenta nas seguintes medidas: (1) Recusa absoluta em aumentar as contribuições das empresas para a Segurança Social, mesmo daquelas que contribuem com muito pouco da riqueza que criam; (2) Redução das pensões a pagar no futuro aos trabalhadores através da introdução do chamado “factor de sustentabilidade” e de uma “nova formula de cálculo das pensões”; (3) Redução da pensão de sobrevivência podendo ser mesmo eliminada para muitos reformados; (4) Introdução de uma formula de actualização anual das pensões que determinaria ou a estagnação do seu poder de compra ou mesmo a sua diminuição.
Como todos estas medidas serão analisadas mais à frente, apenas interessa aqui referir que todas elas têm o mesmo resultado: a redução significativa das já baixas pensões que recebem os portugueses. E a finalidade parece ser a mesma da “reforma” do PSD/PP, que é obrigar os trabalhadores a investirem nos fundos de pensões. Mesmo uma das propostas do governo PS é precisamente essa: para compensar a redução das pensões que as medidas que defende inevitavelmente provocariam, os trabalhadores deviam investir as poucas poupanças que conseguirem acumular em fundos de pensões ou, em alternativa, trabalhar para além dos 65 anos.
3- A reforma da Segurança Social que garante direitos aos trabalhadores e reformados
Diferentemente da “reforma” do PSD/PP que defende a introdução do “plafonamento” (tecto contributivo) para assim baixar as pensões pagas pelo sistema público da Segurança e obrigar os trabalhadores a aplicar as suas reduzidas pensões em fundos de pensões privadas fazendo depender o valor da sua pensão da bolsa de valores; diferentemente também da “reforma “ do governo PS que pretende garantir a sustentabilidade da Segurança Social através de uma diminuição significativa das pensões pagas, aqueles que defendem uma reforma da Segurança Social que assegure a sua sustentabilidade financeira a médio e a longo prazo e que garanta os interesses e os direitos dos reformados e de todos os trabalhadores propõem, contrariamente ao governo PS e ao PP/CDS, que ela assente fundamentalmente numa diversificação das fontes de financiamento como até estabelece a Lei de Bases da Segurança Social. E essas medidas necessárias são fundamentalmente as seguintes: (a) Uma nova politica de crescimento económico e de aumento do emprego; (b) Uniformização das múltiplas taxas contributivas que existem na Segurança Social, todas inferiores à Taxa Social Única , que fazem perder à Segurança Social muitos milhões de euros de receita; (c) A resolução da situação dos chamados “falsos recibos verdes” que tem os mesmo efeitos para a Segurança Social e que cria graves injustiças; (d) Um combate muito mais eficaz à fraude e evasão de contribuições à Segurança Social, porque os resultados que têm sido alcançados, apesar de muito mediatizados, têm sido manifestamente insuficientes; ( e) Que a parte da riqueza liquida criada anualmente pelas empresas que não contribui para a Segurança Social passe a fazê-lo; (f) A criação de uma taxa sobre o VAL a ser paga pelas empresas que contribuem com pouco para a Segurança Social; (g) Uma contribuição de solidariedade a ser paga pelos rendimentos isentos e pelos bens que são considerados manifestações de fortuna. Todas estas medidas serão analisadas na pergunta XVII.
VI – QUAL SERIA A REDUÇÃO DA PENSÃO NO FUTURO QUE A APLICAÇÃO DO “FACTOR DE SUSTENTABILIDADE” DO GOVERNO DETERMINARIA?
O governo PS tenciona introduzir aquilo a que chama “factor de sustentabilidade”. Por isso, é fundamental ficar a saber o que é factor de sustentabilidade, como se calcula e quais as consequências para os trabalhadores e reformados.
Para se saber como se calcula, pois imediatamente se entende o que é, é necessário ter presente o seguinte. O governo afirma que a esperança de vida aos 65 anos aumentará um ano em cada 10 anos. Como a esperança de vida aos 65 anos, em 2006, deverá rondar os 18 anos, daqui a dez anos seria de 19 anos porque aumentaria um ano; daqui a 20 seria de 20 anos porque aumentaria dois anos, etc.,etc. O valor do chamado “factor de sustentabilidade do governo” calcula-se dividindo a esperança de vida aos 65 anos em 2006, que deverá rondar os 18 anos, pela esperança de vida aos 65 anos na data que o trabalhador se reformar. Os valores do “factor de sustentabilidade” para 2016, 2026, 2036 e 2046 constam do quadro III.
QUADRO III – O valor do “factor de sustentabilidade do governo”
DESIGNAÇÃO
2006
2016
2026
2036
2046
EV65 (Esperança de vida aos 65 anos)
18
19
20
21
22
(EV65de 2006) : ( EV65do ano X)
18/18
18/19
18/20
18/21
18/22
Valor do “factor de sustentabilidade “
100,0%
94,7%
90,0%
85,7%
81,8%
REDUÇÃO DA PENSÃO
0%
-5%
-10%
-14%
-18%
Portanto, um trabalhador que se reformasse em 2016, veria o valor da sua pensão de reforma diminuir em -5% devido à aplicação do factor de sustentabilidade do governo; se se reformasse em 2026, a redução já seria de -10%; em 2036 de -14%; em 2046 seria já de -18%, etc. . E isto admitindo que o governo não agravasse ainda mais este factor, porque depois de introduzido seria então fácil alterá-lo para pior no futuro.
Para se poder ficar com uma ideia mais clara da forma como se aplicaria o chamado “factor de sustentabilidade” e das consequências da sua aplicação para os trabalhadores, apresenta-se no quadro seguinte os resultados da sua aplicação a uma pensão de reforma de 450 euros.
QUADRO IV – Redução de uma pensão de reforma de 450 euros devido à
aplicação do “factor de sustentabilidade do governo”
ANOS
Valor do
Aplicação do factor
Valor da pensão depois
Redução na
Factor
a uma pensão de 450€
de se aplicar o "factor"
Pensão
2006
100,0%
450 x 1
450 euros
0
2016
94,7%
450 x 0,947
426 euros
-24 euros
2026
90,0%
450 x 0,9
405 euros
-45 euros
2036
85,7%
450 x 0,857
386 euros
-64 euros
2046
81,8%
450 x 0,818
368 euros
-82 euros
O aumento da esperança de vida aos 65 anos em quatro anos, determinaria que uma pensão de 450 euros ficasse reduzida apenas a 386 euros. E como se sabe, o aumento da esperança de vida é bastante aleatório e, neste caso, ainda mais porque ficaria dependente das previsões, muito falíveis, de uma chamada “comissão técnica independente”.
Entre 1998/99 e 2003/2004, a esperança de vida aos 65 anos aumentou em Portugal, segundo o INE, nos homens de 15 para 15,9 anos e, nas mulheres, de 18,5 para 19,3 anos. Em resumo em cinco anos, a esperança de vida aumentou 0,9 anos nos homens e 0,8 anos nas mulheres, portanto mais de que um ano em cada dez anos. E quanto maior for o aumento maior será também a redução na pensão.
Desta forma, o governo PS tenciona introduzir no sistema público de Segurança Social um factor aleatório o que determinaria, à semelhança do que sucede com fundos de pensões que estão dependentes dos resultados da bolsa (com a introdução do “factor de sustentabilidade” a bolsa passaria a ser “o aumento da esperança de vida aos 65 anos”), uma grande incerteza para o trabalhador sobre o valor da pensão que receberia quando se reformasse. E tenha-se presente que a esperança de vida numa sociedade não é igual para todos. Estudos feitos na Inglaterra mostraram que existiam diferentes esperanças de vida para as diferentes classes sociais, sendo tanto mais elevada quanto mais elevado for o nível de vida e o acesso a cuidados de saúde. O chamado factor de sustentabilidade não é mais do que um factor de redução das pensões, a que se deu aquele nome para esconder o verdadeiro objectivo.
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